24. O RAPTO DA
EUROPA, NÃO POR ZEUS
O dia de ontem, 20 de
fevereiro, foi um dia que ficará para a história como o dia de luto para a
Europa, o dia de Finados para a União Europeia, o dia do réprobo geral à
Alemanha e o dia da vergonha para Portugal.
O dia
de luto para a Europa, porque o presidente do Eurogrupo (o Sr. Jeroen
Dijsselbloem), num momento crucial para esta instituição, se acobardou perante
Berlim.
O dia
de Finados para a União Europeia, porque o Presidente da Comissão Europeia (Jean-Claude
Juncker), um experimentado político, retrocedeu o seu apoio à causa grega e foi
incapaz de impor a sua manifesta vontade a favor da antiausteridade na Europa.
O dia do réprobo à
Alemanha, porque o seu Ministro das Finanças (Wolfgang Schäuble) e a sua acólita
(Angela Merkel) conseguiram travar um processo de repúdio aos nefastos
programas de austeridade impostos a alguns países europeus, através do qual os
gregos pediam apoio para programas mais sensatos e humanos.
O dia da vergonha de
Portugal, pela subjugação canina do seu incompetente Primeiro-Ministro (Coelho)
ao lamber as botas do diabólico ministro
alemão.
Como a maioria dos
europeus, admirei a coragem e o destemor de Alexis Tsipras e Yanis Varoufakis ao
tentarem a saída da Grécia do programa dito de assistência, que na realidade é
de agiotagem do capital internacional, não se negando a pagar a dívida do país,
mas sim a equacionar a sua amortização para abrandar o sufoco e a miséria a que
foi lançado uma boa parte do povo grego, e não só — some-se Itália, Espanha, Portugal,
Chipre etc.
O certo é que a
Alemanha que saiu destruída da 2ª Grande Guerra, provocada por ela, que no
pós-guerra recebeu um colossal auxílio financeiro dos E.U. e de outros países
europeus, tendo depois essa dívida perdoada, incrivelmente, hoje domina
totalmente a dita União Europeia, económica e politicamente. Há alguma razão? Tem
algum cabimento? E faz sentido que menospreze claramente os países europeus do
Sul, a que chama de preguiçosos e gastadores? Quando a Itália, a França, a Grécia,
a Espanha eram vigorosas culturas, que deram coesão e prestígio à Europa, a
Alemanha era um país de bárbaros.
O belo sonho da
Europa unida, tão bem idealizado, está a ser torpedeado sem escrúpulos ou
hesitações por quem dele devia melhor cuidar. Não estará na altura destes
indesejáveis países do Sul saírem em conjunto da União Europeia e formarem a
União Europeia do Sul, com a sua moeda e economia próprias? Sem o peso
burocrático e dispendioso de Bruxelas. Dessa forma a importação de produtos
alemães e de outros países do Norte da Europa seriam tributados, dando melhores
oportunidades aos dos seus próprios países. A Europa do Sul não precisa dos
carros, das cervejas e dos alfinetes alemães.
E já não estaria na
hora dos povos ‘gastadores’ do Sul começarem a boicotar os produtos alemães?
Não haverá alguém que encabece esse movimento desde já?
Num século a Alemanha provocou três sangrentas guerras, e
perdeu-as. Mas deixou sempre muita miséria, mortes e destruição. Atualmente
está de novo a provocar miséria, mortes e destruição. Como não considerar os
bairros miseráveis onde se amontoam milhões de habitantes destes países do Sul
da Europa como novos campos de concentração, onde inocentes morrem de fome, de
frio e de doenças, sem terem culpas, e apenas para que os capitalistas alemães
enriqueçam? Que devemos à Alemanha? O Requiem
de Mozart para acompanhar os nossos mortos?
Ao que parece a cruz
suástica esconde-se agora no símbolo do euro.
Estamos agora à mercê
do despeito, da crueldade e do cinismo do prepotente senhor Schäuble, como há
décadas estivemos de um outro louco de bigodinho de triste memória. Não estará agora
na hora de rever O Grande Ditador, de
Chaplin?
Como é possível que um
ministro Alemão se atreva a ladrar que o povo grego não deveria ter eleito
Tsipras? Que audácia e que desrespeito pelos outros povos! E como se não
bastasse, depois da reunião de ontem, em que teimosa e cruelmente impediu que
os outros países analisassem com atenção e democraticamente a proposta grega,
ainda teve o atrevimento de dizer: “E agora o que é que o Sr. Tsipras vai dizer
ao povo grego?”
Como é possível que
mais de duas dúzias de chefes de Estado europeus ‘soberanos’ fiquem calados
perante estas incríveis afirmações?
Não quero aqui e
agora falar do Presidente da República de Portugal e das suas habituais gafes
políticas, que bem contribuem para a nossa vergonha. Esperemos pacientemente
que ele volte para o seu Algarve.
Mas não posso deixar
de falar da insensatez do Primeiro-Ministro (evitei dizer nosso), que não
percebe que o ‘caso’ grego pode fazer toda a diferença, para melhor ou para
pior, para a crise portuguesa. Penso que possivelmente ele não ganhará as
próximas eleições (acredito nos portugueses), mas o que me pergunto é o que acontecerá a ele posteriormente? Será julgado
em Tribunal Criminal por tantas mortes e destruição que causou, ou simplesmente
irá roçar as suas calças em Bruxelas ou numa grande empresa?
Já disse que, para
Portugal, 20 de fevereiro é o dia da vergonha pelo comportamento servil de
Coelho à dupla alemã, mas não só. Mais caricato ainda, é a Ministra das
Finanças de Portugal prestar-se ao papel de panfletária a favor da austeridade
apresentando o país como um exemplo de sucesso do programa da troika, um desrespeito aos muitos
milhares que aqui estão na miséria e desempregados, para agradar aos alemães.
Não sei se se lembram
de Fritz Lang no início da sua carreira de cineasta nos estúdios da UFA, no seu
país, a Alemanha (Dr. Mabude e M de Matar)?
Nos seus filmes dessa época apareciam umas figuras disformes e pérfidas que
aterrorizavam as plateias. Depois ele foi para os Estados Unidos onde dirigiu
belíssimos filmes, entre eles o corajoso Os
Carrascos também Morrem (sobre o
assassinato de crianças pelos nazis, estando estes ainda no poder,1943). Parece que Lang deixou à solta, no seu país
natal, descendentes desses monstrinhos.
Não, não, a mítica
Europa não foi raptada por Zeus, mas por Schäuble e Merkel!
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