5-O ROXO DOS
JACARANDÁS
Quando em abril do
ano passado enviei a edição digital da minha primeira novela, O Roxo dos
Jacarandás, para os meus amigos e familiares, tive algumas surpresas e
muita indecisão. Surpreendi-me porque muitos dos que o receberam, leram
realmente o livro e, bastantes, declararam ter gostado e lido com prazer. Ao
enviar alguns desses exemplares não esperava que fossem lidos, mas não podia
deixar de os remeter por uma questão de cortesia. Quanto ao elogiarem,
evidentemente que era uma opinião ‘suspeita’ para mim, devido aos laços que nos unem, claro, não que
estivessem deliberadamente a mentir, mas porque, sendo um texto escrito por mim, era lido com benevolência.
Escrevi esse romance
em dois meses, não o deixei amadurecer, nem o revi cuidadosamente, portanto não
esperava tão calorosa recetividade. Não, não tem a profundidade de um Joyce, e
talvez isso tenha ajudado ao agrado. Em geral, também agradou muito o facto de
a novela acabar com quatro finais diferentes, pois como durante a leitura o
final era previsto com facilidade, decidi trocar as voltas ao leitor.
Nunca mais reli essa
novela e agora, mais de um ano depois, lembro pouco dela e tenho dificuldade em
avaliá-la. Talvez um dia a releia, a amplie, a modifique, ou seja, tente
melhorá-la. Só então decidirei se a publico e a coloco nas livrarias.
Também me surpreendeu
muito descobrir que a maior parte dos lisboetas não sabem o nome dos jacarandás
que tanto embelezam Lisboa, na primavera.
Mas acabada essa novela, escrita sem muita
determinação, eu perguntava a mim mesmo: porque é que em vez de continuar, como
sempre, a leitura de tantos autores que adoro, e outros que ainda penso
conhecer, deveria continuar a escrever? Sabendo, como muito bem sei, que já não
tenho tempo de vida suficiente para criar leitores. Um escritor leva o seu
tempo, maior ou menor, a conquistar o seu público.
Claro não estamos a
falar dos autores lançados com uma gigantesca operação de marketing e,
que muitas vezes, nem são escritos pelo que aparece como autor. Hoje é muito
mais difícil para um escritor português conseguir emergir no mercado nacional,
perante a enxurrada de lançamentos de títulos que chegam todos os dias às
nossas livrarias, impulsionados por sucesso em outros mercados, de autores de
todos os idiomas, países, religiões e raças.
Antes de me decidir a continuar a escrever, cultivei as
minhas dúvidas hamletianas, até que me decidi a experimentar de novo.
Ocasionalmente, há dias, li em Tabucchi (Viagens e outras Viagens) um
texto muito interessante: “Ao escrever imaginamos ser outro e viver uma vida
diferente. E estar noutro lugar.” E, ainda: “A literatura – disse um poeta – é a prova de que a vida não basta.”
Encontrei nestes
textos uma explicação porque desde aí, em treze meses, escrevi mais três
livros, dois livros de contos e um romance. Tempo roubado à leitura e à
exibição de filmes em casa.
Mas, voltando a Tabucchi,
sim, acho que quando escrevo viajo dentro de mim, ao meu passado, vivido ou
desejado, ao encontro dos meus amigos e, especialmente, das mulheres que amei,
das pessoas que estimei.
Não que eu não viaje
mais geograficamente, não que eu não continue a cultivar a amizade de alguns
bons amigos, não que eu não mais ame intensamente, mas a recordação de uma vida
já tão longa e tão cheia, como da que felizmente beneficiei, inunda-me e dá-me
vontade de mergulhar de novo em mundos já longe, no tempo, no espaço, na
realidade.
Não tenho a veleidade
de escrever, como Neruda, Confesso que Vivi, mas vivi também intensa e
entusiasticamente. E amei muito, muito mesmo, mulheres, crianças, escritores,
poetas, atores, atrizes e realizadores, cidades, pintores, músicos e
compositores e, com persistência, os livros.
Além de amar os livros
passivamente, como leitor, amei-os e amo como editor. Abracei entusiasticamente
a arte de editar, a faculdade de levar as mensagens, as ideias, o verbo e o
verso, de outros autores até aos seus leitores. Posso garantir que sempre em
obras bem cuidadas, no texto e na estética, como sempre foi o meu desígnio, o
que, modéstia à parte, consegui.
Recordá-lo faz-me feliz, tentar agora continuar com uma nova
editora será um bálsamo. Esta é a razão
de ter criado agora a «4 Estações-Editora», quatro anos depois de vender a «Vogais &
Companhia».
Parafraseando Pessoa:
“Editar é preciso.”
***
Sem comentários:
Enviar um comentário